Apesar de todos os esforços do governo, a indústria brasileira de transformação não ganhou confiança para desengavetar novos projetos de investimento em 2013. Ao contrário, o setor pretende investir este ano 9,5% menos que em 2012. O valor deverá cair de R$ 218 bilhões para R$ 197,3 bilhões, de acordo com uma pesquisa de intenção de investimento que acaba de ser tabulada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Para chegar a esses números, a entidade ouviu mais de 1,2 mil empresas com fábricas em todo o País, entre os dias 22 de janeiro e 23 de fevereiro deste ano.
O resultado surpreendeu o diretor do departamento de competitividade e tecnologia da Fiesp, José Ricardo Roriz Coelho, responsável pela pesquisa. Tanto que mandou auditar os dados. Ele esperava alguma retomada do investimento depois de o governo Dilma Rousseff ter lançado 15 pacotes de medidas para incentivar o setor produtivo. O último, anunciado quinta feira, liberou R$ 33 milhões para financiar projetos de empresas privadas na área de inovação, pesquisa e desenvolvimento.
“O governo fez muitas coisas corajosas no ano passado, como o corte na taxa básica de juros, a desoneração da folha de pagamentos, a redução do custo da energia elétrica e mesmo com o câmbio”, cita Roriz Coelho. “Mesmo assim, a pesquisa está indicando que ainda existem muitas dúvidas do empresário em investir, em aumentar a capacidade de sua fábrica e depois não ter condições competitivas para vender a produção.”
O diretor da Fiesp não foi o único a ser surpreendido pela resposta das indústrias. “É uma ducha de água fria nas expectativas de dez entre dez economistas”, diz Júlio Sérgio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e professor da Unicamp. “Não é a primeira vez que os economistas acreditam em uma coisa e os empresários, em outra”, acrescentou, bem humorado.
A questão é que a indústria está definhando já faz algum tempo. Em 2012, por exemplo, a produção física caiu 2,8%, depois de ter ficado estagnada em 2011. Além disso, a balança comercial (diferença entre a exportação e a importação) do setor apresentou em 2012 o maior déficit da sua história, de US$ 50,6 bilhões.
O resultado é que o setor passou a representar só 13,3% do Produto Interno Bruto (PIB), sua menor participação na formação de riqueza do País dos últimos 50 anos. Em 1985, o número foi bem maior, de 27%.
“Essa retração na intenção de investimento faz todo sentido com o clima que percebemos nesse começo de ano nas empresas”, diz Sergio Valle, economista-chefe da MB Associados. “Há uma percepção de que haverá dificuldade de recuperação este ano.” Parte disso, segundo ele, se dá pela baixa competitividade da indústria, que não incentiva as empresas a exportar. Outra parte se dá “pelas incertezas regulatórias que o governo coloca e que sustam os investimentos”.
Confusão. O economista observa, no entanto, que os dados de investimento que são divulgados periodicamente pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) podem causar confusão, já que o banco acena com expansão para 2013. Os números, no entanto, referem-se ao investimento global, incluindo infraestrutura, óleo e gás e agricultura, por exemplo, que vão bem, e não apenas industrial. “Além disso, caminhões entram em bens de capital e há apenas um efeito estatístico por causa da retração que tivemos no ano passado pela mudança do motor para euro 5, mais caro que o anterior.”
As empresas entrevistadas pela Fiesp mostraram que a elevada carga tributária continua como principal limitante ao investimento. Contudo, o peso dos tributos perdeu importância (em resposta múltipla, foi citado por 56% dos entrevistados, ante 75% em 2012) porque outros fatores ganharam relevância. É o caso da baixa taxa de crescimento da economia, apontada por 36% dos entrevistados. Na pesquisa anterior, foram só 26%,
Arrependimento. O empresário Corrado Vallo, sócio da Omel Bombas e Compressores Ltda, que fornece equipamentos para a indústria petroquímica, sentiu isso na pele. Há dois anos, a empresa investiu R$ 6 milhões na compra de máquinas e ainda tinha planos de investir outros R$ 6 milhões na construção de uma nova unidade.
“Desistimos desse projeto porque simplesmente não tem demanda”, conta o empresário. “Até nos arrependemos um pouco de ter comprado aquelas máquinas, avançadíssimas, de comando numérico para usinar peças de três eixos, que não existiam no Brasil, porque elas deveriam trabalhar em três turnos e só estamos conseguindo rodar um turno por falta de serviço.”
De acordo com a pesquisa da Fiesp, o investimento industrial em máquinas e equipamentos é o que deverá apresentar maior queda este ano, de 16,4%. Enquanto em 2012 foram investidos R$ 160 bilhões, agora se espera que sejam investidos só R$ 133,8 bilhões.
“É caro investir no Brasil”, queixa-se Luiz Aubert Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). “É muito mais fácil trazer o produto pronto de fora, porque o retorno sobre o investimento é demorado demais, em razão das altas taxas de juros e do peso dos impostos que temos aqui.”
Um único setor deverá receber mais dinheiro este ano. Os investimentos em gestão deverão crescer de R$ 17,2 bilhões, em 2012, para R$ 27,3 bilhões, um salto de 58,4%.
“Esse aumento significativo deve-se à estratégia de eficiência produtiva adotada pelas empresas, que visa a reduzir custos e a substituir máquinas obsoletas por versões modernas”, explica Roriz Coelho.
Na contramão da maioria das indústrias, a Monsanto do Brasil está ampliando investimentos. Em 2013, o grupo americano vai investir US$ 1,53 bilhão em pesquisa e tecnologia em todo o mundo. Boa parte desses recursos vem para o Brasil, segundo o Eduardo Bezerra, diretor de Finanças e Estratégia da Monsanto do Brasil.
O País é hoje o segundo maior mercado para a Monsanto no mundo, após os Estados Unidos. Dedicada ao desenvolvimento de herbicidas, sementes convencionais e geneticamente modificadas, a Monsanto faturou R$ 3,4 bilhões no Brasil em 2012, alta de 21,4% sobre 2011.
Expansão. Nos últimos dez anos, a filial brasileira recebeu investimentos de mais de US$ 1 bilhão e apresenta o maior potencial de crescimento no setor agrícola, comparado aos demais países onde a companhia está presente. “O fluxo de investimentos da Monsanto no Brasil tem sido constante e crescente nos últimos anos”, diz Bezerra.
Esses investimentos são resultado da combinação de vários fatores, como um mercado agrícola em forte expansão, uma demanda global por alimentos cada vez mais forte e o uso de novas tecnologias pelos produtores rurais. Além disso, o executivo diz que o Brasil tem condições agronômicas favoráveis, com até duas safras no ano, e um sistema regulatório que permite investimentos em pesquisa e tecnologia e respeito pela propriedade intelectual.
Na semana passada, a companhia inaugurou, em Petrolina (PE), sua 36.ª unidade no País. Trata-se de uma unidade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas de milho, soja, algodão, sorgo e cana-de-açúcar voltados para o mercado brasileiro. O investimento na unidade ficou em US$ 20 milhões.
O Brasil é o segundo maior mercado mundial para culturas geneticamente modificadas. Em 2012, segundo o ISAAA (órgão internacional que monitora a utilização da biotecnologia na agricultura), o Brasil plantou 36,6 milhões de hectares com culturas transgênicas. Só perdeu para os EUA, com 69,5 milhões de hectares. A Argentina veio em terceiro, com 23,9 milhões de hectares. Em todo o mundo, foram plantados 170,3 milhões de hectares com culturas transgênicas, alta de 6% sobre 2011. / M.R.
Fonte: O Estadão.