Jurí­dicas

ANAC exige multas sem previsão legal

Empresas de aviação tem sido penalizadas pela ANAC com multas fixadas tão somente em resoluções, ou seja, não há lei em sentido formal estabelecendo a penalidade pecuniária imposta pela agência, o que, de forma flagrante, viola o princípio constitucional da legalidade.

De acordo com a Constituição Federal, em seu art. 5o, inciso II, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. No caso das multas da ANAC, contudo, não há lei fixando o valor aplicado.

Empresas tem sido autuadas com base no art. 302, III, ‘e’, do CBA, que prevê penalidade para quem “não observar as normas e regulamentos relativos à manutenção e operação das aeronaves”. Todavia, não há previsão na lei do valor da  penalidade. Logo, carece de fundamento legal a cobrança de multa, o que leva a sua nulidade.

As agências reguladoras, como a ANAC, não tem poder regulamentar que supra a lacuna legal, por conta do princípio da legalidade. Respeitando este princípio, a própria lei criadora da ANAC não prevê poderes para a agência preencher lacunas legais, muito menos fixar valor de multa, estabelecendo a Lei 11.182/2005 apenas a competência para regulamentar o que já estiver previsto em lei em sentido formal, conforme seu art. 47:
Art. 47. Na aplicação desta Lei, serão observadas as seguintes disposições:
I – os regulamentos, normas e demais regras em vigor serão gradativamente substituídos por regulamentação a ser editada pela ANAC, sendo que as concessões, permissões e autorizações pertinentes a prestação de serviços aéreos e a exploração de áreas e instalações aeroportuárias continuarão regidas pelos atuais regulamentos, normas e regras, enquanto não for editada nova regulamentação;

E recentemente, o Supremo Tribunal Federal corroborou a conclusão acima, ao afirmar que portaria de Ministério não tem poder para fixar valor de multa ou taxa sem que haja um parâmetro legal, conforme decisão abaixo:

EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário. Taxa SISCOMEX. Majoração. Portaria. Delegação. Artigo 3o, § 2o, Lei no 9.716/98. Ausência de balizas mínimas definidas em lei. Princípio da Legalidade. Violação. Atualização. Índices oficiais. Possibilidade. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem acompanhado um movimento de maior flexibilização do Princípio da Legalidade em matéria de delegação legislativa, desde que o legislador estabeleça o desenho mínimo que evite o arbítrio. 2. Diante dos parâmetros já traçados na jurisprudência da Corte, a delegação contida no art. 3o, § 2o, da Lei no 9.716/98 restou incompleta ou defeituosa, pois o legislador não estabeleceu o desenho mínimo que evitasse o arbítrio fiscal. 3. Esse entendimento não conduz a invalidade da taxa SISCOMEX, tampouco impede que o Poder Executivo atualize os valores previamente fixados na lei, de acordo com os índices oficiais, conforme amplamente aceito na jurisprudência da Corte. 4. Agravo regimental não provido.
(RE 1095001 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 06/03/2018)

O raciocínio acima aplica-se  ao caso das multas da ANAC, pois foi declarada inconstitucional cobrança de taxa cujo valor não tem “desenho mínimo que evitasse o arbítrio fiscal”. É exatamente o que ocorre no caso da ANAC: sem que a Lei 11.182 estabelecesse parâmetros dentro dos quais a agência fixaria o valor das multas, foi editada resolução, com longa tabela de penas pecuniárias, para as quais não há qualquer base legal para a sua fixação.

E a Justiça Federal em Brasília confirmou o entendimento exposto. “Sua atribuição é regulatória e fiscalizatória, dentre outras, mas sem a competência de instituir penalidades ao arrepio do procedimento formal para criar obrigação ao particular, sob pena de haver delegação de poder legislativo, por natureza indelegável”. Com estas palavras, o Juiz Cleberson José Rocha, da 7ª Vara Federal de Brasília, suspendeu autuação contra empresa de aviação agrícola, em decisão de 20 de novembro de 2018.

Cabe então às empresas buscarem o seu direito, freando na Justiça as cobranças sem base legal.

FONTE: TRF1

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