A multinacional norte-americana Monsanto, uma das líderes em biotecnologia agrícola, terá de pagar indenização de R$ 500 mil a título de danos morais aos consumidores por veicular propaganda abusiva. Em 2004, a empresa relacionou o uso de semente de soja transgênica e de herbicida à base de glifosato, usado no seu plantio, como benéfico à conservação do meio ambiente.
A decisão é da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, proferida em 14 de agosto. O valor da indenização deverá ser revertido ao Fundo de Recuperação de Bens Lesados, instituído pela Lei Estadual 10.913/1997.
A empresa também foi condenada a divulgar uma contrapropaganda, esclarecendo as consequências negativas que a utilização de qualquer agrotóxico causa à saúde humana e dos animais. A peça deverá ser veiculada com a mesma frequência e, preferencialmente, no mesmo veículo, local, espaço e horário do comercial contestado, no prazo de 30 dias após a publicação da decisão do TRF-4. Em caso de descumprimento da decisão judicial, incide multa diária de R$ 10 mil. Ainda cabe recurso.
Segundo o Ministério Público Federal, que ajuizou a Ação Civil Pública contra a Monsanto, o comercial era enganoso. O objetivo da publicidade era preparar o mercado para a aquisição de sementes geneticamente modificadas – conhecidas como OGMs – e do herbicida usado neste tipo de plantio, justamente no momento em que se discutia no país a aprovação da Lei de Biossegurança, promulgada em 2005.
A campanha foi veiculada na TV, nas rádios e na imprensa escrita. Tratava-se de um diálogo entre pai e filho, no qual o primeiro explicava o que significava a palavra “orgulho”, ligando essa ao sentimento resultante de seu trabalho com sementes transgênicas, com o seguinte texto:
– Pai, o que é o orgulho?
– Orgulho é o que eu sinto quando olho essa lavoura. Quando eu vejo a importância dessa soja transgênica para a agricultura e a economia do Brasil. O orgulho é saber que a gente está protegendo o meio ambiente, usando o plantio direto com menos herbicida. O orgulho é poder ajudar o país a produzir mais alimentos e de qualidade. Entendeu o que é orgulho, filho?
– Entendi. É o que sinto de você, pai.
A empresa se defendeu argumentando que a campanha tinha fins institucionais e não comerciais. Que o comercial dirigia-se aos agricultores gaúchos de Passo Fundo, com o objetivo de homenagear o pioneirismo no plantio de soja transgênica, técnica que demanda menos herbicida e preserva mais o meio ambiente.
A Justiça Federal de Passo Fundo considerou a ação improcedente, e a sentença absolveu a Monsanto. A decisão levou o MPF a recorrer ao tribunal. Segundo o parquet federal, a empresa foi oportunista ao veicular em campanha publicitária assunto polêmico como o plantio de transgênicos e a quantidade de herbicida usada nesse tipo de lavoura. “Não existe certeza científica acerca de que a soja comercializada pela Monsanto usa menos herbicida”, salientou o MPF.
Sentença reformada
O relator do voto vencedor no tribunal, desembargador federal Jorge Antônio Maurique, reformou a sentença. “Tratando-se a ré de empresa de biotecnologia, parece óbvio não ter pretendido gastar recursos financeiros com comercial para divulgar benefícios do plantio direto para o meio ambiente, mas sim a soja transgênica que produz e comercializa”, afirmou Maurique.
O desembargador analisou os estudos constantes nos autos apresentados pelo MPF e chegou à conclusão de que não procede a afirmação publicitária da Monsanto de que o plantio de sementes transgênicas demanda menor uso de agrotóxicos. Também apontou que agricultores em várias partes do mundo relatam que o herbicida à base de glifosato já encontra resistência de plantas daninhas.
Segundo Maurique, a propaganda deveria, no mínimo, advertir que os benefícios nela apregoados não são unânimes no meio científico e advertir expressamente sobre os malefícios da utilização de agrotóxicos de qualquer espécie.
O desembargador lembrou ainda em seu voto que, quando veiculada a propaganda, a soja transgênica não estava legalizada no país e era oriunda de contrabando. O comercial era um incentivo à atividade criminosa, que deveria ser coibida. “A ré realizou propaganda abusiva e enganosa, pois enalteceu produto cuja venda era proibida no Brasil”, concluiu o magistrado.
Fonte: Conjur.