A Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) deve incluir nos contratos de prestação de serviço a possibilidade de ministrar aulas em regime de tutoria, quando a turma contar com menos de 25 alunos. O contrato também deve prever a opção do aluno desistir de cursar alguma disciplina em razão de sua oferta em regime diferenciado, com a devolução dos valores pagos, devidamente corrigidos – acrescidos de eventuais perdas e danos. Estas são as principais determinações constantes na sentença proferida pelo juiz Daniel Machado da Rocha, da Vara Federal de Execuções Fiscais de Canoas (RS), ao julgar parcialmente procedente uma Ação Coletiva de Consumo ajuizada pelo Ministério Público Federal. A decisão é do dia 19 de dezembro e, desta, cabe recurso.
O juiz condenou a instituição de ensino a indenizar os alunos que cursaram disciplinas em regime de tutoria acima do limite máximo de 20% – como determina a Portaria 4.059/04 do MEC ou em condições diversas do previsto pela Resolução 0161/2002, da própria universidade. Por fim, concedeu antecipação de tutela para determinar que a Ulbra promova as alterações contratuais no prazo de 15 dias após a intimação da sentença. Para cada caso de descumprimento, o juiz federal fixou multa de R$ 3 mil.
Originalmente, a Ação Coletiva de Consumo foi proposta pelo Ministério Público estadual (MP-RS), para quem a Comunidade Evangélica Luterana São Paulo (conhecida no mercado como Ulbra) estaria realizando prática comercial abusiva contra os estudantes do Curso Tecnológico de Desenvolvimento de Software. Dentre estas práticas, os promotores gaúchos destacaram o cancelamento de disciplinas; a redução do número de disciplinas ofertadas, o que não permitiria aos alunos a conclusão do curso no tempo contratado; e a imposição do regime de tutoria, com o pagamento integral sendo feito pelo aluno, mesmo com o número de aulas reduzido pela metade após o início do semestre. Além disso, o MP pediu a condenação da ré pelos danos materiais e morais causados aos consumidores, individualmente considerados.
Tendo em vista que estava em discussão a qualidade do ensino superior, matéria de interesse da alçada da União, a Justiça Estadual declinou de sua competência. Como a demanda passou a tramitar na Justiça Federal de Canoas – município limítrofe de Porto Alegre e sede da Ulbra –, o MPF assumiu a titularidade da ação, ratificando os argumentos expostos na inicial.
Após citação judicial, a Ulbra apresentou contestação. Disse que seu estatuto não mais permitiria que turmas presenciais fossem transformadas em turmas por tutoria – opção restrita, apenas, aos alunos formandos. Argumentou que o pedido de preço diferenciado para as disciplinas oferecidas por tutoria fere o princípio da livre iniciativa. Alegou ausência de comprovação de danos materiais e morais advindos do ensino através de tutoria.
O juiz federal Daniel Machado da Rocha disse que a ‘‘autonomia’’ não concede às universidades uma carta em branco. ‘‘Devem ser observadas as determinações expedidas pelo Ministério da Educação, destinadas a assegurar uma padronização mínima da qualidade do ensino.” Rocha destacou também o fato de que a Portaria 4.059/04 do MEC limita o uso da modalidade semipresencial em 20% da carga horária do curso.
Conforme o juiz, com o objetivo de padronizar as atividades de ensino pela modalidade de tutoria, a Ulbra aprovou a Resolução 0161, de 27 de novembro de 2002. ‘‘Como se extrai do referido ato, ela pode ser entendida como uma modalidade de ensino ministrada individualmente ou para pequenos grupos, quando não for possível o oferecimento de turma regular para uma determinada disciplina (item 1, folha 177, do Inquérito Civil em anexo)’’, sublinhou na sentença.
Para o titular da Vara Federal de Execuções Fiscais de Canoas, ninguém deseja que as universidades privadas tenham prejuízo, pois é sabido que os contratos devem guardar um equilíbrio financeiro. Contudo, no seu entendimento, o fornecedor descumpriu o dever de informação quando deixou de divulgar ao consumidor situações que, sendo do seu conhecimento prévio, podem afetar substancialmente a qualidade do produto ou serviço ofertado.
‘‘Ora, pela sua experiência, tinha a Ulbra plena consciência de que um curso pode apresentar turmas que, isoladamente, sejam deficitárias, levando a Universidade a ter de ofertar a disciplina em condições especiais. Mas a maior parte dos consumidores, que realizam um curso universitário pela primeira vez, não tem a obrigação de adivinhar esta circunstância’’, advertiu.
FONTE: http://www.conjur.com.br