Ação penal só pode ser extinta por Habeas Corpus em caso de flagrante constrangimento ilegal. Esse não é o caso de alegação de exercício de liberdade religiosa e de expressão que não configura ofensa, algo que precisa ser analisado mais profundamente pelo juiz.
Com esse entendimento, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, indeferiu pedido formulado em ação cautelar ajuizada pela defesa do padre Jonas Abib, que responde por ofensa a outras religiões em livro de sua autoria. A defesa pretendia sobrestar o processo, sustentando que “a manifestação de opinião em nome da fé católica não legitima a deflagração de ação penal”.
O sacerdote foi denunciado pelo Ministério Público do Estado da Bahia em 2008 com fundamento em trechos do livro Sim, Sim, Não, Não – Reflexões de Cura e Libertação, publicado em 2007. Segundo a denúncia, o autor “faz afirmações discriminatórias à religião espírita e às religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé”.
Os advogados pediam, na ação cautelar, que se atribuísse efeito suspensivo a recurso contra decisão do Superior Tribunal de Justiça que, ao rejeitar Habeas Corpus lá impetrado, negou o trancamento da ação penal. Segundo o acórdão do STJ, a denúncia preenchia os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, descrevendo fatos que, em tese, configuram o crime previsto no artigo 20 da Lei 7.716/1989 — “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”.
Na AC 4.158, a defesa do padre sustenta que ele é autor da obra na condição de sacerdote da Igreja Católica e que a denúncia “pinçou seis frases esparsas de um livro de 127 páginas, que se encontra na sua 85ª edição nacional, para, fora de seu contexto, tentar fundamentar a prática de discriminação religiosa”. Ainda segundo os advogados, “a conduta imputada é acobertada pela liberdade de expressão e de religião”.
Direitos relativos
Ao negar o pedido cautelar, o ministro Fachin assinalou que a extinção da ação penal mediante HC, como tenta a defesa no STJ, é medida reservada aos casos de evidente constrangimento ilegal. “Num juízo de cognição sumária, não depreendo ilegalidade flagrante na decisão daquela corte a justificar a excepcional concessão do efeito suspensivo”, afirmou.
Segundo o relator, os direitos individuais da liberdade religiosa e de expressão não são absolutos e incondicionais, e não é possível, por meio de Habeas Corpus, averiguar a conformidade constitucional do conteúdo publicado, a intenção do autor ou se o pensamento explicitado ultrapassa ou não o exercício regular das liberdades constitucionais. “Essa tarefa deve ser implementada pelo juiz natural, com base no conjunto probatório e no cenário em que os acontecimentos teriam se desenrolado”, explicou.
O ministro observou que o teor da obra deve ser compreendido à luz da inteireza da publicação, não sendo possível, por meio de ação cautelar, enfrentar a questão com profundidade. “Ausente evidente ilegalidade, a dúvida é resolvida em favor do prosseguimento da ação penal, arena em que o acusado poderá exercitar o contraditório de modo amplo e debater a regularidade do exercício da liberdade religiosa no contexto do caso concreto”, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.
Fonte: Conjur.